Senna, 30 anos - Capítulo 8: o fatídico acidente era mais grave do que pensava

Lívio Oricchio descreve o GPdream club soccerSan Marinodream club soccer1994, desde a largada até a batida na Tamburello, e a angustiante viagem até o Hospitaldream club soccerBolonha na esperançadream club soccerque Ayrton sobreviveria

Por Lívio Oricchio,dream club soccerespecial para o ge — São Paulo


Chocante: dirigi 40 longos minutos até o hospitaldream club soccerBolonha a fimdream club soccersaber se Senna sobreviveria ao acidente.

Olha, amigo, automobilismo é um esportedream club soccerrisco. Mesmo com todas as preocupações relativas à segurança, ainda hoje, sempre é possível ocorrer uma fatalidade,dream club soccerum treino ou uma corrida.

Ayrton Senna dentrodream club soccersua Williams, pouco antes da largada do GPdream club soccerSan Marinodream club soccer1994 — Foto: Paul-Henri Cahier/Getty Images

Você vai entenderdream club soccerbreve a minha escolhadream club socceriniciar o capítulo falando disso.

A credencialdream club soccerimprensa distribuída pela FIA traz essa informação, para lembrar que não apenas os pilotos, mas todos que estão no autódromo trabalhamdream club socceruma áreadream club soccerrisco. Quer saber mais? A entidade deixa por escrito, na credencial, que se acontecer algo com você, ela não tem responsabilidade alguma.

30 anos sem Ayrton Senna: uma homenagem ao ídolodream club soccerInterlagos

dream club soccer Tragédiasdream club soccersucessão

Veja esses exemplosdream club soccerfatalidades não sódream club soccerpilotos:dream club soccer1953, o italiano Giuseppe Farina perdeu o controle dadream club soccerFerrari 500 na 30ª volta do GP da Argentina,dream club soccerBuenos Aires, e matou nove espectadores. Em Monza,dream club soccer1961, o alemão Wolfgang von Trips acabou envolvidodream club socceroutra tragédia.

Ele estabelecera a pole position comdream club soccerFerrari 156. De repente, antes da curva Parabólica, na primeira volta do GP da Itália, tocado involuntariamente pela Lotusdream club soccerJim Clark, a Ferrari tomou a direção da torcida, instalada sobre um barranco que serviadream club soccerbarreiradream club soccerproteção. Não funcionou. A Ferrari atingiu a áreadream club soccercima do barranco edream club soccerseguida voltou, virada, para a pista.

Von Trips, que podia ser campeão do mundo naquela prova, morreu, assim como outros 13 torcedores. E, nas 24 Horasdream club soccerLe Mans,dream club soccer1955, a Mercedes do francês Pierre Levegh voou na direção das arquibancadas e matou 84 pessoas.

GP da Itáliadream club soccer1961 teve acidente fatal que matou 14 pessoas — Foto: Getty Images

dream club soccer Ímola, agora

A largada do GPdream club soccerSan Marino ainda não fora dada e já havia um morto na história: Roland Ratzenberger, no sábado. Recapitulando: novedream club soccer1953 na Argentina, 14 na Itáliadream club soccer1961 e 84dream club soccerLe Mans,dream club soccer1955, dentre tantos outros acidentes graves.

A grande diferença é que meu conhecimento daquelas provas se resumia ao contato com a literatura específica. Em Ímola, 1994, eu vivia as tragédias pessoalmente. E os pilotos,dream club soccerquestão, não eram completos desconhecidos para mim.

Como escrevi no capítulo anterior, Jyrki Jarvilehto não disputara as duas primeiras etapas da temporada por ter se acidentado, com gravidade, na curva Stowe,dream club soccerSilverstone, na pré-temporada. Ele era o companheirodream club soccerSchumacher, com Benetton B194-Ford. No sábado, no fim da tarde, conversei com ele.

Ratzenberger já tinha morrido. “Eu tive muita sorte”, disse Jarvilehto. Ele sofreu fraturadream club soccerduas vértebras cervicais e, por milagre, a lesão óssea não se estendeu até a medula nervosa, que corre por dentro das cervicais. Se isso tivesse ocorrido, estaria provavelmente paralítico, no mínimo.

Confira os últimos capítulos da série Senna, 30 anos:

dream club soccer Já na largada, quase mais mortes

O GPdream club soccerSan Marino começa tambémdream club soccergrande estilo. 14 horas: Roland Bruynseraede autoriza a largada da corrida. O público é excelente, comodream club soccerhábito na Itália. Jyrki Jarvilehto, quinto no grid, não larga. O motor Ford dadream club soccerBenetton morreu.

Uma parte do pelotão consegue desviar, masdream club soccerposição é muito na frente no grid.

Largada do GPdream club soccerSan Marinodream club soccer1994 teve acidente. Repare no pneu voando no lado esquerdo da imagem — Foto: Zentralbild/ullstein bild via Getty Images

O português Pedro Lamy, com Lotus 107C-Mugen Honda, acertadream club soccercheio a traseira da Benetton, parada na pista. Uma roda da Lotus voa na direção da arquibancada e atinge vários torcedores. Com carros e detritos para todo lado no asfalto, o diretordream club soccerprova ordena a entrada do safety car na pista. Senna lidera a corrida, seguido por Schumacher.

Da saladream club soccerimprensa, onde eu estava, temia pelas vidasdream club soccerLamy, Jarvilehto e das pessoas que receberam o impacto da roda da Lotus. Dá para compreender como todos que estavam no autódromo viam seus temores crescerem a cada instante?

Estávamos sensibilizados com os acidentes da pré-temporada, envolvendo o próprio finlandês e Jean Alesi e naquele fimdream club soccersemana até então. Problemas gravesdream club soccersegurança se sucediam sem parar.

De novo, conversávamos entre nós, jornalistas, que John Barnard, conceituado projetista, estava com a razão: retiraram a eletrônica embarcada e não reduziram a potência, deixando os carros inguiáveis.

dream club soccer Inadequação total do safety car

Nós esperávamos por outras más notícias. E ela veio mais cedo do que supúnhamos. Os carros passavam na minha frente. Da janela da saladream club soccerimprensa à pista não havia maisdream club soccer30 metros. O safety car liderava o corso, com Sennadream club soccerprimeiro e Schumacherdream club soccersegundo. O safety car, naquela época, era um veículodream club soccersérie, sem maiores preparações.

A velocidade com que percorria o circuito pouco tinha a ver com o mínimo exigido pelos carrosdream club soccerF1 para manter a temperatura dos pneus e dos freios num valor mínimo aceitável para quando a corrida fosse reiniciada.

Hoje, o safety car é um Aston Martin Vantage ou um Mercedes GT Black Series, com motordream club soccer700 cavalos, superpreparado para o que a F1 exige. E sempre conduzido pelo mesmo piloto, o alemão Bernd Maylander, desde o ano 2000, isso mesmo, 24 anos. Isso dá uma boa noção da responsabilidade desse complexo e perigoso procedimentodream club soccerneutralizar a competição, diante das consequências que pode gerar se o passo a passo não for seguido à risca.

Williamsdream club soccerAyrton Senna lidera o pelotão seguindo o safety car (fora da imagem) no GPdream club soccerSan Marinodream club soccer1994 — Foto: Claire Mackintosh/EMPICS via Getty Images

dream club soccer Williams lançava fagulhas pelo assoalho, atrás

No fim da quinta volta do GPdream club soccerSan Marino, o safety car deixou a pista e a corrida foi reiniciada. Vi a traseira da Williamsdream club soccerSenna, ao passar na minha frente, raspando o asfalto com violência poucas vezes vista. Lançava fagulhas pela traseira, muitas, resultantes do contato dos discosdream club soccermetal existentes na prancha sob o assoalho com o asfalto.

Compreendi que a baixa velocidade do safety car fez com que a pressão dos pneus da Williams caísse perigosamente.

Senna passou por onde me encontrava, pouco depois da linhadream club soccerchegada, local da saladream club soccerimprensa, abrindo a volta como líder depois da saída do safety car, com Schumacher sempre bem próximo.

dream club soccer Perdadream club soccertrajetória assustadora

Eu o vi passar e, ao sair do meu campodream club soccervisão, já no início da Tamburello, voltei-me para o aparelhodream club soccerTV na minha frente. A imagem que surgiu já mostrou a Williams seguindo reto logo depoisdream club soccercomeçar a contornar a velocíssima curva, percorrida com o acelerador no curso máximo,dream club soccersexta marcha, a pouco menosdream club soccer300 km/h. Foi assustador pelo que poderia acontecer na sequência.

Lembrodream club soccerter visto a hora no terminaldream club soccercomputador na saladream club soccerimprensa. Ele nos repassa uma sériedream club soccerinformações: 14 horas e 17 minutos, sexta volta do GPdream club soccerSan Marino, a primeira desde a relargada da prova.

Curiosamente, ao entender que Senna iria colidir no muro, a primeira coisa que me veio à mente foi que aquela seria outra etapa sem marcar pontos. Repare que a noçãodream club soccerum Senna imortal estava incrustada tambémdream club soccermim. Tinha consciênciadream club soccerque ele iria se chocardream club socceralta velocidade, masdream club soccernenhum instante imaginei que pudesse se ferir. Ao menos gravemente.

O acidentedream club soccerAyrton Senna na Curva Tamburello, no GPdream club soccerSan Marinodream club soccer1994 — Foto: Alberto Pizzoli/Sygma via Getty Images

A imagem seguinte que nos foi oferecida pela TV italiana era já a da Williams desacelerando depois do impacto no muro. Epa, pensei! Bateu forte mesmo. Enquanto o carro ainda se arrastava no cimento branco da reduzida áreadream club soccerescape da Tamburello, eu tentava identificar o estado do cockpit, verificar se o santantônio estava inteiro. Enfim, qualquer dado que me permitisse formar uma ideia da gravidade do ocorrido.

Quando a Williams parou, com Senna inerte dentro, e ele deu aquela pequena mexida na cabeça, imaginei que não se tratavadream club soccerum acidente fatal. Ao contrário, naqueles segundos tinha a impressãodream club soccerque Senna teria se ferido sem maior gravidade.

Mas, ao rever o acidente, logodream club soccerseguida, pude compreender que o ângulodream club soccerimpacto da Williams no muro não fora pequeno e a distância percorrida desde o choque até a imobilização sugeria ter havido uma desaceleração violenta, maior perigo nos acidentes. Identifiquei ao mesmo tempo, porém, bons sinais. O cockpit parecia inteiro, bem como o santantônio, barradream club soccerproteção, atrás e acima da cabeça do piloto.

dream club soccer A dura verdade emerge

O trágico acidente na curva Tamburello interrompeu a carreira vitoriosadream club soccerAyrton Senna na F-1 — Foto: Getty Images

Tudo começou a mudar quando vi o pessoal do regaste estender um lençol branco a fimdream club soccerimpedir a obtençãodream club soccermais imagens do atendimento ao piloto. Isso sempre é um indicativodream club soccersérios ferimentos.

O quadro se complicou ainda mais ao ver sangue no chão. Não estava certo se vinhadream club socceruma hemorragia oudream club soccertraqueostomia, para permitir que Senna respirasse melhor.

Mais: os pésdream club soccerSenna, deitado no chão, estavam por demais abertos. Se fossem os ponteirosdream club soccerum relógio, definiriam quase o horário 15 para as 3 horas. Tinha a certezadream club soccerque o piloto estava inconsciente.

Nesse instante, saí da saladream club soccerimprensa e fui até a saídadream club soccerboxe,dream club socceronde poderia atingir, por fora, cercadream club soccer300 metros adiante, o local do acidente na Tamburello. Mas os comissários haviam bloqueado a passagem. Permaneci lá uns cinco minutos, acompanhando tudo através das imagensdream club soccerTV instaladas nos boxes da Minardi. Fiquei ali para ver se não me deixavam mesmo passar. Na Itália, nem tudo é “pão, pão, queijo, queijo”.

dream club soccer Mais grave do que pensava

Angelo Orsi, um velho amigo da famíliadream club soccerSenna, fotógrafo da revista Autosprint, com quem converso regularmente, voltava do local da batida.

- Ele está mal, muito mal, perdia muito sangue pela cabeça - foram suas primeiras palavras. Levei um susto. Pela primeira vez compreendi que o caso era mais grave do que pensava.

Ao cairdream club soccermim, corri para a saladream club soccerimprensa a fimdream club soccerpegar meu computador, a bolsa e me dirigir,dream club soccernovo, para o Hospital Maggioredream club soccerBolonha, um velho conhecido. Eu já estivera lá na sexta-feira à noite, para visitar o Rubinho. Agora, no domingo, repetiria os cercadream club soccer50 quilômetros que separam o autódromo do hospital. Para algo inacreditável: descobrir se Senna iria sobreviver.

Eu estava revoltado. Depoisdream club soccertantas desgraças, a próxima era previsível. Não sei se por inocência, comecei a achar que a corrida não deveria ser disputada. Alguma coisa estava errada e, quem sabe, Barnard estivesse certo demais. Jádream club soccerposse das minhas coisas, caminhei rápido até o estacionamento da imprensa, ao lado da curva Rivazza.

dream club soccer Vocês querem matar mais um?

Larini, Schumacher e Hakkinen no pódio do GPdream club soccerSan Marinodream club soccer1994 — Foto: Getty Images

Na horadream club soccerque estava abrindo a porta do meu carro, ouvi o ronco ensurdecedor dos motores dos monopostosdream club soccerF1 passando por ali, bem próximodream club socceronde estava, ainda atrás do safety car. Seria dada uma nova largada, sem Barrichello, sem Ratzenberger e, agora, sem Senna.

Ainda hoje reflito sobre o meu comportamento naquele instante. Lembrodream club soccerter gritado para alguém, sei lá quem, pois estava realmente atingido com a sequênciadream club soccertragédias: Vocês querem matar mais um?

Mas, apesar do meu protesto, lá no fundo ainda tinha esperançasdream club soccerchegar no Hospital Maggiore e receber a notíciadream club soccerque Senna estava sendo operado, seu estado era grave, mas não irreversível.

dream club soccer Pronto, cheguei no Hospital Maggiore

Muito bem, acabodream club soccerentrar no hospital Maggiore onde, como escrevi, já havia estado para visitar o Rubinho na sexta-feira.

No próximo capítulo narro a minha reveladora conversa com os médicos que atenderam Senna ainda na maca, na pista, e durante o voodream club soccerhelicóptero até o hospital. Foi um grande baque para mim!

Logo depoisdream club soccerestacionar o carro e entrar no Hospital Maggiore acessei sem nenhum impedimento o 11º andar, onde estava a Unidadedream club soccerTerapia Intensiva (UTI). Fui o primeiro, talvez, a chegar.

Mais Senna, 30 anos:

Saí do elevador e bem próximo, na porta da UTI, havia um médico conversando com um colega. Eu perguntei se sabiam algodream club soccerSenna, se ele estava lá. O médico se apresentou, era o doutor Giovanni Gordini. O outro era o doutor Domenico Salcito, os responsáveis por atender Senna na pista e voar com ele no helicóptero até o hospital. Muito profissionais e gentis.

O doutor Gordini descreveu o que se passava. Apesardream club soccerprofissional, demonstrava estar sentindo muito aquilo tudo. Dentro da UTI, Senna estava sob os cuidadosdream club socceroutros especialistas, como os neurocirurgiões Franco Servadei e o doutor Andreolli.

Ao saber que eu era jornalista e a trabalhodream club socceruma mídia brasileira, o jornal O Estadodream club soccerS.Paulo, o doutor Gordini começou a me contar os detalhes do atendimento a Senna ainda na maca e depois no helicóptero. Por ter formação acadêmica biológica também, eu podia compreender tudo o que me explicavadream club soccervoz baixa, lentamente.

No próximo capítulo narro tudodream club soccerdetalhes. Até mais.