Por Irlan Simões

Jornalista e pesquisador do futebol

Em cinco anos, maisquantum roleta120 clubes europeus foram incorporados a redes multi-clubes

Ritmoquantum roletacrescimento dos “multi-club ownership” segue acelerado,quantum roletaacordo com novo levantamento da UEFA; entenda o que isso tem a ver com o Brasil

Rioquantum roletaJaneiro


A onda dos “multi-club ownership” (propriedadequantum roletamúltiplos clubes) segue avançando sobre o continente europeu e pelo resto do mundo. É o que aponta os novos dados apresentados pela UEFA no seu relatório “The European Club Finance and Investment Landscape”, publicadoquantum roletafevereiro.

Nas últimas cinco temporadas, ao menos 122 clubes teriam sido adquiridos por redes “multi-club ownership” (chamaremosquantum roletaMCO a partir daqui), tendo outros 67 clubes recebidos investimentos minoritáriosquantum roletagrupos que já controlam outras agremiações.

Com a Lei das SAF, o futebol brasileiro entrouquantum roletaduas ondas ao mesmo tempo: a adoção do modelo empresarial, com donos; e a entradaquantum roletagrandes redes internacionaisquantum roletaclubes sob um mesmo grupo proprietário.

As SAFsquantum roletaBotafogo, Vasco, Bahia e Cruzeiro –quantum roletadiferentes formatos e proporções – já nasceram sob essa lógica, razãoquantum roletasobra para o público local atentar para esse poderoso fenômeno.

Nesta 15ª edição do seu anuário – um documento extenso e repletoquantum roletadados sobre temas variados –, o Centroquantum roletaInteligência da UEFA atualizou os números referentes às aquisições (multi-club ownerships) e aos investimentos minoritários (multi-club investments)quantum roletaclubes europeus. Os dados, reformuladosquantum roletanovas imagens pelo blog, são surpreendentes.

— Foto: Elaboração: Irlan Simões

Pelo segundo ano consecutivo, maisquantum roleta30 clubes europeus,quantum roletadiferentes níveisquantum roletaliga equantum roletadivisão, foram adquiridos por grupos que já possuiam ao menos um clubequantum roletaseu portifólio. Apesar da leve queda no quesito “comprasquantum roletaparte minoritária” (em cor mais clara no gráfico), o recorte acumulado mostra que a décadaquantum roleta2020 é caracterizada pelo apetite voraz desses MCOs.

A relevância do fenômeno levou a UEFA a levantar dados sobre o paísquantum roletaorigem dos clubes envolvidosquantum roletaredesquantum roletaCOM, o que permitiu observar três países com papel relevante nessa nova “tesequantum roletainvestimentos

— Foto: Elaboração: Irlan Simões

Na 15ª posição está a Arábia Saudita, que promoveu a estatização dos quatro maiores clubes locais, agora propriedades do fundo soberano nacional. Duas posições à frente já aparece o Brasil, listado pela UEFA com 6 clubes – além dos quatro já mencionados, o Red Bull Bragantino também pertence a uma rede; o sexto clube, supõe o blog, seria o antigo Red Bull Brasil, da mesma rede, agora chamado Red Bull Bragantino II (o relatório não lista o nome dos clubes).

O país que mais se destaca nessa nova ordem do futebol global são os Estados Unidos, 4º no ranking, que já possuem 24 das suas franquias esportivas (de diferentes ligas) vinculadas a redesquantum roletaMCO no futebol. A razão para um número tão grande residequantum roletaoutro dado muito importante levantado pelo Centroquantum roletaInteligência da UEFA: a origem dos proprietários.

O gráfico a seguir mostra a origem dos investidores dos clubes europeus envolvidosquantum roletaredes MCO. Nada menos que 65 clubes estão sob controlequantum roletanorte-americanos, que constituem hoje,quantum roletalonge, a nacionalidade com maior presença no processoquantum roletacompraquantum roletaclubes e na elaboraçãoquantum roletaredes do tipo.

— Foto: Elaboração: Irlan Simões

O blog já trouxe o temaquantum roletaduas diferentes ocasiões, observando como esses grupos estão demonstrando uma força política capazquantum roletamoldar os próprios regulamentos das competições europeias, que costumava regulamentar a questão.

No gráfico reformulado pelo blog, foram somados os dadosquantum roletadez países europeus listados no ranking dos 15 principais paísesquantum roletaorigem (para além Itália, Reino Unido, Alemanha, Espanha, Áustria, Suíça e Rússia, ainda há Portugal e Países Baixos).

Ao todo, 73 clubes europeus envolvidosquantum roletaMCOs pertencem a grupos desses dez países, um número que provavelmente será superado pelos norte-americanos nos próximos anos. Para além do interesse dos proprietários dos clubes “individuais”, os próprios atuais donosquantum roletaredes parecem interessadosquantum roletavender seus ativos.

Em 2022, o belga Roland Duchatelet vendeu a maioria dos seus seis clubes: o húngaro Ujpest, os belgas Standard Liege e Sint-Truidense, o espanhol AD Alcorcon, o inglês Charlton Athletic e o alemão Carl Zeiss Jena (onde ainda investe).

Mas também vale observar o movimento dos MCOs a partir do interessequantum roletaestar onde o dinheiro flui melhor. Embora existam diferentes estratégias entre os grupos, o interesse passa quase sempre pelo acesso às receitas colossais do futebol britânico. No gráfico abaixo, elaborado também a partir dos dados do relatório da UEFA, é possível notar como a Premier League está distanciada do resto do futebol europeu.

— Foto: Elaboração: Irlan Simões

Apesarquantum roletaser comum falar do “futebol europeu” como uma unidade, na realidade sempre se falou das Big 5 Leagues, as cinco maiores ligas, que envolvem Inglaterra, Espanha, Alemanha, Itália e França, e que representaram juntas 73%quantum roletatoda riqueza gerada no futebol da Europa.

Mas mesmo dentro desse clube dos muito ricos a diferença é brutal. Combinado, os clubes da Premier League arrecadam praticamente a soma dos clubes da Bundesliga equantum roletaLa Liga juntos, as segunda e terceira maiores ligas do planeta.

E mesmo tão distante dos ingleses, alemães, espanhóis, italianos e franceses ainda estão bem à frente dos vizinhos – com exceção da Rússia, que recebe valores anormaisquantum roletapatrocínios, emquantum roletamaioria empresas estatais.

É o cenário que ajuda a entender, voltando para o segundo gráfico, a razãoquantum roletatanta procura por clubesquantum roletaPortugal e da Bélgica: são países habituados a recrutar jogadoresquantum roletapaíses periféricos e depois negociá-los por ótimos valores para as ligas centrais. As redesquantum roletaMCOs parecem dominar essa dinâmica, se estabelecendo tanto nos países centrais, quanto nos menores.

Por fim, também vale apreciar o material original trazido pela UEFA,quantum roletaum mapa que ilustra a profundidade da presença dessas redesquantum roletaMCO no continente.

Os pontosquantum roletamarrom escuro representam os clubesquantum roletaprimeira divisão, os pontosquantum roletacor mais clara indicam os clubesquantum roletasegunda divisão e os pontos cinzas indicam os clubesquantum roletaterceira divisão ou abaixo.

— Foto: Fonte: UEFA - The European Club Finance and Investment Landscape (2024)

E há dois elucidativos gráficosquantum roletapizza: o primeiro mostra que 37% dos clubes ilustrado fazem partequantum roletauma rede global; quando 63% se resumem a redes unicamente europeias. Nesse caso, vale lembrar que a UEFA considera como partequantum roletauma “rede” qualquer clube cujo proprietário tenha ao menos um segundo clube sob seu controle/investimento.

O segundo gráficoquantum roletapizza destaca que 29% desses muitos clubes possuem investimentos minoritáriosquantum roletaredes. Um exemplo disso seria o inglês Crystal Palace, que tem John Textor e David Blitzer como investidores não-majoritários, ambos proprietáriosquantum roletaredes diferentes.

aa — Foto: Elaboraçao: Irlan Simões

O caso do Crystal Palace, inclusive, é um exemplo perfeitoquantum roletacomo o fenômeno dos multi-club ownership está ganhando contornos cada vez mais complexos. Diferentes grupos estão estabelecendo pontosquantum roletacontato atravésquantum roletaclubesquantum roletacomum, que aparentemente também indicam formasquantum roletarelacionamento mais sofisticados.

Hoje, está cada vez mais importante observar o movimento dos atletas a partir dos clubesquantum roletasaída equantum roletaentrada, porque tudo indica que ambos estão relacionadosquantum roletaalguma medida – se não diretamente na mesma rede, potencialmente entre duas redes “parceiras”.

Um futebol completamente novo está sendo desenhado por esses movimentos, majoritariamente norte-americanos, que deixam sérias dúvidas sobre quando equantum roletaquais circunstâncias vai desacelerar – e muito mais dúvidas sobre as suas consequências no que entendemos por futebol.

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- Irlan Simões (@irlansimoes) é autor do livro “A Produção do Clube: poder, negócio e comunidade no futebol” (2023).