Por Allan Caldas

Repórter e redatorFutebol Internacional do ge

A Copa Feminina2023 será lembrada como deve ser: o grande palco da excelência no futebol

A competição que acontece na Austrália e Nova Zelândia tem grandes jogos, dramas, torcidasêxtase, tudo que marca a históriaqualquer Mundial. Mas isso não significa que os problemas estão todos resolvidos

Sydney, Austrália


Duelos espetaculares, dramas que aceleram o coração das torcidas, craques se despedindo, craques surgindo, torcedoresêxtase (oulágrimas)... A história da Copa do Mundo Feminina2023 será contada muito mais pelo viés esportivo do que pelas bandeiras que ainda se levantam, e devem ser levantadas, na modalidade.

Jogadoras da Austrália comemoram a classificação inédita para a semifinal da Copa do Mundo — Foto: Reuters

Se o Mundial2019 entrou para a história pelo necessário e essencial protesto por "Equal Pay", que alavancou a discussão por equidade salarial e iniciou uma ondamudançasdiversos países, o2023 está empolgando pela alta qualidade do futebol. E uma coisa não desmerece a outra. Em 2019 também vimos grandes times. Em 2023, ainda precisamos levantar bandeiras (as do passado e outras que estão chegando).

As causas que são muito caras à modalidade - equidade salarial eestruturatrabalho, direitos básicos das mulheres, incluindo assistência às jogadoras na maternidade, representatividade das pessoas LGBTQIA+ e outras reivindicações históricas - continuam na pauta das jogadoras. E sempre estarão, porque isso também faz parte do Mundial Feminino.

Só que agora também podemos celebrar que, mesmo com tanto ainda a resolver, dentrocampo - e nas arquibancadas, nas Fan Fests, nas ruas, pela TV - nós estamos vendo uma senhora Copa do Mundo.

Copa do Mundo Feminina entra na última semana como um sucessopúblico

ClimaCopa do Mundo

Essa é a grande vitória da competição que chega este ano ànona edição. O clima vivido na Austrália e na Nova Zelândia foiuma grande festa esportiva, como acontecequalquer Mundial, por acaso dessa vez jogado por mulheres. Não existe diferença, na paixão e na qualidadecampo, do Mundial dos homens.

Horaabrir aquele eterno parênteses para explicar aos que ainda bradam "Está comparando futebol feminino com masculino?!?!?". Para o jogo das mulheres ter qualidade não é necessário que elas "vençam" um time masculino. É o mesmo esporte, mas são modalidades distintas. Como no basquete, vôlei, natação, atletismo, tênis...

Se não há uma invasãotorcidas estrangeiras por aqui - a distância, que ajuda a elevar os custos, contribuiu bastante para isso -, a súbita empolgação dos australianos com a campanha das Maltildas, como é conhecida a seleção femininafutebol, compensou a diversidadeidiomas. Um esporte não tão popular no país se transformouverdadeira febre nacional.

A qualidade da Copa Feminina pode, sim, ser comparada à Masculina porque houve um maior nivelamento entre as equipes, gerando disputas cada vez mais imprevisíveis e emocionantes. Em resumo: vimos vários jogostirar o fôlego por aqui. Também porque o nível técnicoquase todas as 32 seleções foi excelente.

Não teve oportunidadeacompanhar muitos jogos, talvez por causa do horário pouco convidativo? Está achando exagerada a análise? Aproveita esta semana e veja a reta final da competição, com as semifinais Espanha x Suécia e Austrália x Inglaterra. E não perca a decisãodomingo.

Evolução física gera novo patamar tático

O bom futebol jogado nesta Copa é reflexoalguns saltos gigantescos dados pela modalidade nos últimos anos. Físico,primeiro lugar. E essa evolução atlética levou o jogo a um novo patamar tático, mesmo equipes que não têm muita tradição agora conseguem ao menos oferecer alguma resistência às favoritas. Com boa preparação física, é possível seguir o planejamento tático durante os 90 minutos.

E, claro, não podemos esquecer da técnica e do talento das jogadoras, que sempre existiu, embora por muito tempo tenha ficado escondido. Com resistência física e plano tático, aí é que o talento desabrocha ainda mais. A primeira Copa Feminina com 32 seleções mostrou ao mundo que quanto mais oportunidade e visibilidade elas tiverem, mais e mais pessoas ficarão espantadas ao descobrir que, sim, elas jogam muito!

Nessa Copa nós vimos que o futuro da modalidade está mais do que garantido. Marta pode se despedir tranquila, seu legado já estáboas mãos. Ou melhor,ótimos pés.

Craques no auge e revelações aos montes

Vimos jogadoras na plenitude da carreiraação nos gramados da Oceania, como as australianas Caitlin Foord e Hayley Raso (ambas28 anos), as suecas Fridolina Rolfö (29) e Stina Blackstenius (27), as espanholas Esther González (30) e Aitana Bonmatí (25) ou as inglesas Keira Walsh (26) e Lucy Bronze (31).

Fiquei só nas semifinalistas e apenas duas jogadoras por time. Poderia citar muitas mais. Exemplos não faltaramexcelência técnica nesta Copadiversas seleções. E as revelações desse Mundial? Sente o naipe: Mary Fowler, australiana20 anos; Lauren James, inglesa21; Salma Paraluello, espanhola19; Selma Bacha, francesa22; Linda Caicedo, pepitaouro colombiana18; as americanas Sophia Smith (22) e Trinity Rodman (21).

Brasil vai mal mas deixa base para 2027

E o Brasil? Sim, não fomos bem coletivamente, mas pode acreditar: a base para 2027 está bem encaminhada, com jogadoras como a zagueira Lauren (20 anos), as volantes Duda Sampaio (22), Angelina (23) e Ary Borges (23), a meia-atacante Kerolin (23) e a atacante Geyse (25).

Sempre haverá muito a se fazer pela modalidade, para recuperar décadasdescaso e preconceito. Mas a Copa2023, com seus jogos emocionantes, suas arquibancadas e Fan Fests lotadas, as despedidas, as novas craques se apresentando ao mundo, com todos esses ingredientes que são os pilares do futebol, a Copa2023 será lembrada como todas devem ser: uma verdadeira Copa do Mundo,toda apaixão e excelência. Por acaso, jogada por mulheres.