Por Douglas Ceconello

Jornalista, um dos fundadores do Impedimento.org, dedicado a... ver mais

Um tombo monumental: rebaixamento do River Plate completa 10 anos

Em 26aposta ganha prognosticosjunhoaposta ganha prognosticos2011, a equipeaposta ganha prognosticosNúñez caía para a segunda divisão argentina pela primeira e única vez. A torcida colocou fogo no estádio e demoliu parte da cidade. O lado positivo é que o mundo passou a conhecer Tano Pasman, o torcedor do século.

ge.globo — Porto Alegre


Pouco depoisaposta ganha prognosticosa bola deixaraposta ganha prognosticosrolar, um trecho próximo à Avenida del Libertador estava transformadoaposta ganha prognosticospraçaaposta ganha prognosticosguerra. Dezenasaposta ganha prognosticoscomércios haviam sido depredados e saqueados, bem como estavam destroçados maisaposta ganha prognosticoscem veículos particulares. Também foram danificadas residências e entradasaposta ganha prognosticosedifícios. Muitos envolvidos acabaram feridos, outros tantos foram presos. Parecia alguma cotundente mobilização popular, mas era muito mais que um cacerolazo porteño: no lugar da economia falida e da poupança perdida, a ruína do orgulho. E a bola não havia deixadoaposta ganha prognosticosrolar por vontade própria, pois a partida havia sido encerrada antes do tempo normal devido à faltaaposta ganha prognosticossegurança. Ao fundo do cenário, o Monumentalaposta ganha prognosticosNúñez ainda fumegava devido às chamas ateadas pela própria torcida. Algumas horas depois, já madrugada, um desnorteado e embriagado jovemaposta ganha prognosticos23 anos cometia suicídio ao se lançar nos trilhos da estação Martín Coronado, na Grande Buenos Aires. À tarde, ele havia testemunhado, na arquibancada, o rebaixamento do River Plate.

A história da retumbante queda do River Plate, que hoje completa dez anos, começou com um título. No Clausuraaposta ganha prognosticos2008, o River treinado por Cholo Simeone conquistava o campeonato e, seis meses depois, pela primeira vezaposta ganha prognosticosmaisaposta ganha prognosticosum século, acabariaaposta ganha prognosticosúltimo na tabela. O técnico pediu demissão, mas a terrível campanha teria consequências macabras -- a queda na Argentina já se definia pelo sistemaaposta ganha prognosticosPromedios, que considera a somaaposta ganha prognosticospontos nas últimas três temporadas. Como se não bastasse, o presidente que chegava, o ídolo Daniel Passarella, levando mais fé no sobrenome do que na realidade, resolvera comprar briga com ninguém menos que Julio Grondona. O fiasco estava desenhado, mas ninguém ousava acreditar: o River Plate na segunda divisão era uma utopia que nem os mais fanáticos torcedores do Boca se permitiam imaginar.

Mas os fracassos se acumularam nos campeonatos seguintes e eis que chegou aquele confronto contra o Lanús,aposta ganha prognosticos18aposta ganha prognosticosjunhoaposta ganha prognosticos2011. Ao serem derrotados pelos granates por 2 a 1,aposta ganha prognosticospleno Monumentalaposta ganha prognosticosNúñez, os millonarios se viam obrigados a disputar a Promoción contra o Belgrano, um dos destaques da segunda divisão. Aos grandes, sempre uma última chance: mesmoaposta ganha prognosticos17º, o River Plate tinha a chanceaposta ganha prognosticosse manter na elite, e ainda contava com a vantagemaposta ganha prognosticosdois placares iguais. Por desesperada ironia, a partida contra o Lanús teve como árbitro Pablo Lunati, que é torcedor assumido do River Plate, hoje com tatuagem e tudo. Logo após apitar o fim do jogo, ele desabafou com um amigo, ainda nos corredores do Monumental: "Nos estamos yendo a la B!".

Se um torcedor que tem o poderaposta ganha prognosticoscarregar o apito estava desesperado, o que dizer dos simples mortais. A primeira partida do duelo crucial contra o Pirataaposta ganha prognosticosCórdoba, no Giganteaposta ganha prognosticosAlberdi, reservou a quase determinante derrotaaposta ganha prognosticos2 a 0, com direito a torcedores do River Plate invadindo o campo para intimidar seus próprios jogadores, mas, sobretudo, permitiu ao mundo conhecer Santiago "Tano" Pasman, que pode muito bem receber a alcunhaaposta ganha prognosticosTorcedor do Século. A família decidiu gravá-lo enquanto assistia ao jogo com a intençãoaposta ganha prognosticosmostrar-lhe que aquela desmesura era um perigo: qualquer dia o amoroso pai e pacífico vizinhoaposta ganha prognosticosBella Vista capotaria morto pelo River Plate. Mas eis que um amigo muy amigo resolveu subir o vídeo no YouTube e estava feito o estrago: quase sete minutosaposta ganha prognosticosimprecações contra tudo e contra todos, com uma enxurradaaposta ganha prognosticospalavrões que não poupava nem o desgraçado do pai "que me fez torcedor do River" eaposta ganha prognosticosalgum momentoaposta ganha prognosticostranstorno gritava por "Isabel!", que até hoje ninguém na família sabeaposta ganha prognosticosquem se trata. "Noooooooooooooooooo! Estamos en la B!", gritava o porta-vozaposta ganha prognosticostodos os millonarios no momento mais dramático da película caseira.

Nenhum dos cinco filhos tomou a iniciativaaposta ganha prognosticosgravar as reações do pacífico ainda que furibundo Tano Pasman no jogo da volta, no Monumentalaposta ganha prognosticosNúñez, mas depois revelaram que ele passou grande parte da tarde chorando. E não era pra menos. Quem não nasceu da pedra entende. Mesmo com os nervos fritos, o time do River Plate esmagou o Belgrano no primeiro tempo. Marcou o primeiro gol, atravésaposta ganha prognosticosMariano Pavone, logo aos cinco minutos, e fez do arqueiro Juan Carlos Olave praticamente um mártir cordobês. Era tudo questãoaposta ganha prognosticostempo, pensavam os millonarios e também algum diabo vestidoaposta ganha prognosticosazul y oro. No intervalo, o juiz Sergio Pezzotta, conforme ele mesmo relatou na súmula, acabou embretado por integrantes dos Borrachos del Tablón, a barra-brava do River Plate. "Se não marcar um pênalti pra gente, vamos te matar." Depois, algumas imagens mostrariam pessoas ligadas à dirigência do River,aposta ganha prognosticosconfiança do próprio Passarella, facilitando o acesso dos barras ao vestiário da arbitragem.

Estrangulado pela iminência do fiasco histórico, o River Plate não foi o mesmo no segundo tempo, tanto que aos 16 minutos sofreu o golaposta ganha prognosticosempate do Belgrano, com o meio-campista Guillermo Farré aproveitando o delírio da zaga millonaria. Talvez por instintoaposta ganha prognosticossobrevivência, após ignorar um pênalti claro para os locais na primeira etapa, o árbitro Sergio Pezzotta apontou a marca da cal para o River, pouco depois do empate cordobês, mas Pavone cobrou com a convicçãoaposta ganha prognosticosum cavalo cego para consagrar novamente o arqueiro Olave. Eram 25 mintos do segundo tempo, o timeaposta ganha prognosticosNúñez continuava precisandoaposta ganha prognosticosdois gols para evitar o maior vexameaposta ganha prognosticossua secular trajetória e a ampulheta da desgraça corria pelo norteaposta ganha prognosticosBuenos Aires como se fosse Juan Manuel Fangio. Não havia mais escapatória e, aos poucos, o Monumental começou a pegar fogo. Os ritosaposta ganha prognosticosdesapego mais traumáticos às vezes têm disso.

Transformadoaposta ganha prognosticosalgoz da tradição, o ex-ídolo e presidente Daniel Passarella recebeu ameçasaposta ganha prognosticosmorte, mas afirmou que só deixaria o River "con los pies para adelante". Ou morto, no caso. Não há orgulho maior do que o do perdedor. Como no casoaposta ganha prognosticosum grupoaposta ganha prognosticostorcedores, que dias depois lançou a ideiaaposta ganha prognosticosque o River Plate deveria disputar a segunda divisão não com a tradicional banda roja atravessada no peito, mas com uma faixa negra,aposta ganha prognosticossinalaposta ganha prognosticosluto, porque "la camiseta no desciende". Uma bobagem, é claro, mas uma bobagem comovente. O veterano atacante César "Picante" Pereyra, aliás, é especialistaaposta ganha prognosticosdesmontar o orgulho alheio: era atacante do Belgrano que rebaixou o River, fez até gol no primeiro jogo, e depois também fez sucumbir o Danubio, no Uruguai, meses atrás, episódio menos midiático mas bastante expressivo. "El Picante" não despreza a chanceaposta ganha prognosticosfutricar na almaaposta ganha prognosticosNúñez: é torcedor do Boca, logo jogou a vida para rebaixar o River. A curiosa nota cromática é que, se a ideia dos torcedores negacionistasaposta ganha prognosticosNúñez tivesse sido levada adiante, a camiseta teria ficado igual à do Danubio, rebaixado uma década depois. A história sempre lhes espera, muchachos.

Dos considerados clubes grandes argentinos, apenas o Boca Juniors nunca foi rebaixado -- além do River Plate, também San Lorenzo, Racing e Independiente já excursionaram pelos mais nobres recantos do país. Depoisaposta ganha prognosticosjunhoaposta ganha prognosticos2011,aposta ganha prognosticosBuenos Aires era comum olharaposta ganha prognosticoslonge uma camisa xeneize com o número ZERO estampado. Aproximando-se, ficava possível pecerber que abaixo do dígito, jamais escolhido por nenhum jogador, estava a palavra descensos. Uma questãoaposta ganha prognosticosorgulho revanchista. Depois da queda, o River Plate passou a viver talvez o melhor momentoaposta ganha prognosticossua história. Conquistou maisaposta ganha prognosticosdez títulos, inclusive duas Libertadores, e fez o Boca Juniorsaposta ganha prognosticosgato e sapato. Na semifinal da Sul-Americana,aposta ganha prognosticos2015, o admirável Tano Pasman sofreu uma isquemia cerebral, ficou um dia internado, e antes da insólita contenda libertadoraaposta ganha prognosticosMadrid, três anos depois, fez questãoaposta ganha prognosticosrealizar um exame completo para ver se o millonario coração estava na ponta dos cascos, ou se pelo menos aguentava um trote a mais.

Houve muita felicidade no lado riverplatense da vida depois daquela tardeaposta ganha prognosticosMonumental incendiado, mas que os médicosaposta ganha prognosticosTano Pasman não se descuidem, pois uma evidência jamais poderá ser apagada: o River pode voltar a ganhar mais catorze Libertadores, pode jogar e vencer outra decisão continental contra o maior rival, sejaaposta ganha prognosticosLa Boca ouaposta ganha prognosticosZurique, mas nunca mais deixaráaposta ganha prognosticoster sido rebaixado. É dessas coisas que não se desfazem. Que levamos para a vida, como a própria sombra.

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