Não podem ser mais diferentes Rogério Ceni e Renato Gaúcho, apenas para citar os dois últimos treinadores do Flamengo. Seja na formação, na valorização dos processos acadêmicos, na disposiçãomtt cbetdebater processos táticos, na metodologiamtt cbettreinos e, claro, na personalidade e no relacionamento pessoal. Pois o Flamengo teve os dois e não suportou ficar com nenhum. Ceni durou oito meses e Renato, pouco maismtt cbetquatro.
Evidente que é imprescindível refletir sobre o técnico e sobre o personagem Renato Gaúcho. Mas, antes disso, resta a inevitável sensaçãomtt cbetque o rubro-negro tem poucas ideias do que pretende para seu projeto esportivo. A julgar pelas inúmeras diferenças entre os treinadores, pelas recentes e controversas modificações feitas nos departamentos médico e físico, pelo númeromtt cbetproblemas que o time enfrentoumtt cbetuma fase importante da temporada, parece justo concluir que o Flamengo precisa que seu norte no futebol vá alémmtt cbetter dinheiro e contratar jogadores excelentes. É claro que o jogo pertence aos jogadores,mtt cbetgrande parte. No entanto, é cada vez mais decidido no terreno das ideias.
Se há algo que não se pode dizermtt cbetRenato Gaúcho é que ele tenha enganado alguém. O que mudou do Renato do Grêmio para o Renato do Flamengo foi a duração da passagem. Já se sabia que o treinador poupa e, por vezes, se poupa; que prefere não discutir, ao menos publicamente, sobre questões táticas; quemtt cbettemas táticos e estratégicos provavelmente não ocupe a primeira prateleira dos treinadores. E que tem virtudes, é óbvio. Entre elas, a habilidademtt cbetgerir pessoas e cultivar bons relacionamentos, qualidade longemtt cbetser desprezível. E isso não quer dizer que seja um indigente tático, ao contrário. Mas, se as ausênciasmtt cbetatividades ou a metodologiamtt cbettrabalho foram os fatores que incomodaram os dirigentes rubro-negros, conforme informa a reportagemmtt cbetCahê Mota, talvez tenhamos um sintomamtt cbetque o clube contratou não um treinador que efetivamente conhecia. Limitou-se a trazer o nome que, aos olhosmtt cbetparte da arquibancada e da opinião pública, era o primeiro da fila.
Mas é preciso ser coerente. É correto constatar que, durante a passagemmtt cbetRenato pelo Flamengo, o nívelmtt cbetjogo do time se deteriorou e as questões estruturais afloraram. Com a bola, faltavam ao time movimentos coordenados contra defesas fechadas. Confirmava-se a sensaçãomtt cbetum trabalho que valorizava demais a intuição dos atletas, a aposta numa liberdade dada aos talentos. Com elas, momentos belíssimos foram produzidos, e a capacidademtt cbetRenatomtt cbetdeixar as estrelas confortáveis para fazê-lo é elogiável. Mas o time parecia carecer, por vezes,mtt cbetum padrão para resolver certas situações. Sem bola, conseguia incomodar rivais com pressão ofensiva, gerando volume. Mas uma vez superada amtt cbetpressão, espaçava-se e cedia muitos espaços com uma transição defensiva desordenada. Aliás,mtt cbetdado momento do trabalho mostrou-se marcante a dificuldade para defender.
Por outro lado, há algo que deve ser dito a favormtt cbetRenato e, a rigor,mtt cbettantos treinadoresmtt cbetatividade no Brasil: não é possível minimizar o fatomtt cbetque foram apenas quatro meses, com jogos seguidos e treinos escassos, desfalques nas datas-Fifa e uma sequênciamtt cbetlesões que levou a formação titular, a que iniciou a final da Libertadores, a jogar junta por apenas 40 minutos. E, neste ponto, a demissãomtt cbetRenato impõe outro debate. O Brasil precisa pararmtt cbetser o pais do “E se...”
Vivemos no perguntando: “E se tal treinador tivesse mais tempo?” Ou então, “e se o técnico pudesse jogar menos e treinar mais?”, “e se não perdesse seus atletas quando a seleção jogasse?” O resultado é que cada trabalho termina sem que saibamos, a rigor, o que cada profissional tem a oferecer. Quando se cobra uma estrutura mais racional para que os profissionais trabalhem, não se tratamtt cbetoferecer uma estabilidade forçada, um seguro a treinadores, tampouco garantir que com o tempo no cargo irão brotar trabalhos bem-sucedidos. O Brasil precisa ser um ambientemtt cbetfutebol organizado, entre outras coisas, para que se separe o joio do trigo, para que se veja quem tem, e quem não tem trabalho a oferecer.
Hoje, somos um lugarmtt cbetque o ambiente do futebol é nocivo à saúde, mais repele profissionaismtt cbetoutras culturas do que atrai. E, neste ponto, nada mais simbólico do que o aviso dado pelo bicampeão da Libertadores Abel Ferreira. Nos dez meses que separaram um títulomtt cbetoutro, sofreu pressões, perdeu jogadores, jogou sem parar, foi ao limite da exaustão. Hoje, é difícil convencer um profissional com acesso à elite do jogo que o Brasil é um bom lugar para trabalhar.