De "Boi Bandido" a Luo Guofu: Aloísio fala da vida na China e o desejojogar no Criciúma

Entrevista com o atacante32 anos faz parte da série "Catarinenses pelo Mundo"

Por Carlos Rauen e Daniela Walzburiech —Florianópolis


Catarinenses pelo Mundo: uma conversa com o atacante Aloísio

A vidaAloísio dos Santos Gonçalves mudou muito nos últimos anos. E não foi apenas no fuso horário entre o Brasil e a China. O catarinense encontrou no pais asiático uma nova cultura, comidas e temperos diferentes para o paladar, um idioma difícilaprender e precisou também lidar com a saudade da família que ficouAraranguá, no SulSanta Catarina, e dos amigos espalhados por Porto Alegre, Chapecó, Florianópolis e São Paulo, as cidades onde morou quando jogava no Brasil.

Em poucos meses, porém, Aloísio promete deixar tudo no passado. O atacante do Guangzhou Evergrande vai retornar ao Brasil assim que o contrato terminar –dezembro2022 – e quer continuar comemorando os gols com a marca registrada: as voadoras.

Em entrevista ao ge, ele contou que o destino ainda é incerto, mas um dos desejos é vestir o preto, branco e amarelo do Criciúma. Seria o terceiro clube no estado do atleta, que deixou a Chapecoense para jogar no Figueirense2011 – ele também defendeu Grêmio e São Paulo no Brasil.

Aloísio Boi Bandido Luo Guofu China seleção — Foto: VCG/VCG via Getty Images

A proximidade da cidade tricolor com Araraguá é um dos motivos para querer jogar no estádio Heriberto Hülse, além do carinho que familiares e amigos têm pelo time carvoeiro.

– Não vou renovar mais. Isso é certo. Se eu estiver bem, correndo como estou hoje, vou querer mais um tempo no Brasil. Se não estiver, vou ter que encerrar minha carreira, pois não quero atrapalhar ninguém. Eu tenho carinho pelo São Paulo, pela Chape e pelo Criciúma. Se eu pudesse decidir e tivesse mais aquele 10%bateria, eu acho que usaria no Criciúma – disse.

Aloísio escreveu um capítulo importante na carreira há quase um ano, no dia 29abril2020, ao ser convocado para seleção chinesa. Após se naturalizar, foi chamado para um períodotreinos e se tornou o terceiro estrangeiro da equipe. Ele adotou a alcunhaLuo Guofu e deixou o apelido"Boi Bandido"lado por um tempo.

– Quando cheguei aqui, eles me chamavam"Boi Selvagem", porque aqui não existe "Boi Bandido", isso só existe no Brasil, não tem tradução"Bandido". E na horaescolher um nome, escolhi Luo Guofu, que pode significar aquele que enriquece o país, por exemplo, a cidade, o país...

Além do futebol e agora da Seleção, Aloísio tem outra paixão no país: a Muralha da China. Antes da pandemia, eram frequentes os passeios do catarinenseum dos monumentos mais famosos do mundo e que tem 21.196 quilômetros.

Aloísiouma das visitas à Muralha da China — Foto: Arquivo pessoal

– Quando eu vim para cá, não gostava muitoviajar, mas comecei a curtir alguns lugares. O que eu preciso visitar? Na hora, quando me perguntam, eu falo que tem que ir na Muralha da China, não tem como vir na China e não ir na Muralha da China. Eu já fui umas dez vezes, é um lugar surreal,uma energia fora do comum. Quem vier tem que ir na Muralha da China, éuma energia surreal.

O Boi Bandido ou Luo Guofo já realizou 182 partidas oficiais no paísquatro clubes – Shandong Luneng, Hebei Fortune, Guangdong Southern Tigers e Guangzhou Evergrande – e marcou 86 gols. Aloísio conquistou a Copa da China e a Supercopa da China, ambas pelo Shandong Luneng.

Confira mais da entrevista:

O BRASIL
– Eu gosto do Brasil, gostojogar o Catarinense, o Brasileiro... Eu vim para cá2014 e curti demais o país. Apesarmorar nos primeiros anoscidades não tão boas para estrangeiros, mas a estrutura dos clubes que eu trabalhei não deixaram eu voltar. Cada jogador que vem para cá vem pensando na parte financeira. O CT, os clubes, como eles tratam jogadores estrangeiros... eu acabei me apaixonando. Foi isso que me deixou oito anos aqui, fora a parte financeira.

Aloisioatuação pela Chapecoense — Foto: Reprodução/Arquivo pessoal

NÍVEL TÉCNICO
Eu fui um dos primeiros daquele pessoal que veio, a gente não tinha noção para quem mandar mensagens pedindo referências. Eu vim meio que no escuro nesse pensamento. Quando eu cheguei, eu vi jogadoresqualidade, óbvio que não para jogargrandes equipes do Brasil, mas tinham qualidade. Acabei vendo coisas que não imaginava. Agora mais ainda. Grandes jogadores já estiveram aqui na China.

CULINÁRIA LOCAL
– Eu gosto bastantecomida japonesa e italiana. No começo foi bem complicado, nos dois primeiros anos foi dificil. Eu morei numa cidade que não tinha bons restaurantes italianos. Depois comecei a procurar, pesquisar. Aquele láXangai tem o feijao brasileiro, aí mandava mensagem pedindo uns dois quilosfeijão. Aquele outro vende carne da Austrália, aí pedia picanha para a gente fazer o churrasco. Agora tiroletra. Aqui na esquinacasa tem um restaurante que a gente encontra muitas comidas brasileiras e fazemos muitas coisas pelo telefone.

IDIOMA LOCAL
– Acredita que eu não sei falar ainda? Virei chinês e falo bem pouco. Eu entendo mais do que eu falo. Desde o começo eu tive um tradutor dentro e fora do campo. Eu aprendi outras línguas. Eu sempre tive tradutor e, infelizmente, não falo fluentemente. Aprendi outras linguas, mas o chinês não.

MORRO DOS CONVENTOS
– Gosto bastante. Não vou comprar todo o Morro dos Conventos (risos). Eu gosto muito, tenho casa lá. Sempre nas férias pego um avião, vou para o Morro e só saiolá no fim das férias. Eu amo Araranguá. O pessoal que está nos assistindo e quiser um lugar bonito, pode ir para o Morro dos Conventos que eu garanto.

AMIZADE COM HÉLDER (DO CRICIÚMA)
– Eu brinco sempre com ele. Jogamos juntos no Grêmio e no Figueirense. Fiquei muito feliz quando ele anunciou que ia jogar no Criciúma. Ele tem muita qualidade, e eu sempre quero que bons jogadores joguem no Criciúma. Essa é uma brincadeira que eu faço. Ele já fez vários cruzamentos para eu fazer o gol, eu sei onde ele cruza. Eu não vou falar aqui, pois quando a gente jogar juntonovo o pessoal vai marcar (risos).

Aloísio e Hélder juntos no Figueirense — Foto: Figueirense/Divulgação

O FUTURO
– Quando eu era pequeno, pedia a Deus para passarano no colégio, ser um jogador profissional e saúde para a minha familia. Tinha mais alguma coisa, mas não lembro agora. Passarano foi ali riscando, quase no limite. Saúde para familia... todos têm saúde. E como jogador profissional eu consegui, Deus me ajudou e me abençoou. Tive oportunidadesjogargrandes clubes. Mas, como a gente sabe, está quase na horaparar. Eu vou deixar essa resposta que se for no Criciúma, vai ser um desejo meu (o último clube). Apesareu ter um carinho muito grande pela Chape, Criciúma é do ladoAraranguá e seria muito legal jogar no Criciúma.

ALOÍSIO CHINÊS
– Eu fui convocado para amistosos. Jogo oficial não fui convocado por conta da pandemia. Vai começarmaio os jogos da Seleção para Copa do Mundo2022. Espero, se eu estiver fazendo um bom trabalho aqui, ser convocado. Está tudo regularizado, tenho passaporte, já virei chinês. Agora é só trabalhar.

AS VOADORAS
– O negócio do Muricy foi legal. A gente estava numa fase muito ruim (no São Paulo). Quando ele chegou, ele deu um ânimo a mais para o nosso time. Os outros treinadores tentaram e não conseguiram. Ele trabalhou conosco e, na hora das comemorações, a gente lembrava dele. Ele era daquele jeito bravo e tudo, mas com a gente sempre foi um paizão e me ajudou muito. Sempre puxava ele, mas depois pedia desculpas. O velhinho está todo quebrado (risos).

Aloisio dá voadoraMuricy pelo São Paulo — Foto: Edson Ruiz/Agência Estado

SAUDADES DE CASA?
– Eu sinto demais. Como é longe, a gente vai uma vez por ano, nas fériasnovembro e dezembro. Eu sinto saudadealgumas coisas: família, amigos, minha casa no Morro dos Conventos... O resto a gente tem tudo aqui.

CABELO
– Faz uns dois anos que estou deixando crescer. Eu não gostoir no salão, até porque tem explicar e, às vezes, eles não fazem ideia do que a gente pediu. Aí corto no Brasil. Eu vou cuidando e ficou desse jeito que vocês tão vendo.