Análise: Espanha repete 2018, troca mil passes e cai nos pênaltis ante Marrocos nas oitavas da Copa

Espanhóis não conseguem superar essa fase do Mundial desde 2010, quando foram campeões

Por Martín Fernandez — Doha, Catar


Aconteceunovo: a Espanha está eliminada da Copa do Mundo. É o destino reservado a quem não consegue converter um gol nem nas cobrançaspênalti. O algoz desta vez foi a corajosa seleçãoMarrocos, que venceu nos penais após empate por 0 a 0 e no próximo sábado, às 12h (de Brasília) vai enfrentar o vencedorPortugal e Suíça nas quartasfinal do Mundial do Catar.

Melhores momentos: Marrocos 0 (3) X (0) 0 Espanha pelas oitavasfinal da Copa do Mundo

Desta vez a Espanha até fez tudo diferente2018, quando caiu nas oitavasfinal ante a Rússia após a deserção do técnico Julen Lopetegui emostrar um futebol triste. Quatro anos depois, o time chegou ao Catar afiado, inspirado pelos millenials Gavi (18 anos) e Pedri (20) e conduzidos por um técnico experimentado e vencedor como Luis Enrique.

Mas o desfecho foi o mesmo. Derrota para Marrocos e mais uma eliminação nas oitavas, fase que superou pela última vez2010. Após o empate sem gols120 minutos, Pablo Sarabia chutou seu pênalti na trave; Carlos Soler, e Sergio Busquets pararam nas mãosBono. O marroquino Hakimi, nascidoMadri, concluiu a série com uma cavadinha.

Jogadores da Espanhaderrota nos pênaltis para Marrocos na Copa — Foto: REUTERS/Bernadett Szabo

Mesmocondições tão mais favoráveis do que na Copa da Rússia, mesmo trocandotécnico, a Espanha não se livrouum velho defeito,uma maneira únicajogar, baseadatrocar infinitos passes até desorganizar a marcação rival e então finalmente concluir.

No Catar, deu certo com a fraquíssima seleção da Costa Rica, numa goleada por 7 a 0 que enganou incautos na Espanha e no resto do Mundo. Os defeitos começaram a aparecer no empate contra a Alemanha, e ficaram escancarados na derrota por 2 a 1 para o Japão – uma atuação tão pobre para o nível dos jogadores disponíveis que autorizou quem quisesse a imaginar que se tratouum plano para ficarsegundo lugar no grupo e evitar o Brasil na rota até a final.

Pois Marrocos bastou. E venceu após um jogo tenso, ríspido, que misturou o quemelhor pode existir no futebolclubes. Parecia um espetáculoCopa Libertadores fora do campo, cortesia da insana torcidaMarrocos; parecia uma exibiçãoChampions League no gramado, graças à altíssima qualidade dos jogadorescampo. Todos os titulares do Marrocos jogam na Europa, alguns são estrelas do PSG (Hakimi), do Chelsea (Zyech), do BayernMunique (Mazraoui).

Ao longotodo o jogo a Espanha fez o que temcaracterística nesta Copa do Mundo: trocou muitos passes – maismil, assim como na EliminaçãoMoscou2018.

Ferran Torres, da Espanha, lamenta chancegol desperdiçada no jogo contra Marrocos — Foto: Fabrizio Bensch/REUTERS

Mas, no primeiro tempo, os raros momentosque os espanhóis estiveram pertogritar gol foram graças a saídasbola arriscadas do goleiro marroquino Yassine Bono. Numa delas Gavi,impedimento, acertou o travessão.

Marrocos se defendeu muito atrás, e bem. Uma linhaquatro, uma linhacinco e Youssef En-Nesyri solto à frente. A Espanha fazia a bola circular mas não causava dano. Durante muitos momentos do jogo a Espanha pôs seus 10 jogadoreslinha no campoataque, com os zagueiros Laporte e Rodri à frente do círculo central, o goleiro Unai Simon quase no meio do campo.

Ainda assim, ou talvez por isso, Marrocos levou mais perigo. O técnico espanhol Luis Enrique surpreendeu ao escalar o volante Marcos Llorentelateral direito –vez dos especialistas Carvajal e Azpilicueta, numa clara tentativaconter o ponta marroquino Sofiane Boufal. Pois foi sempre pela direita que Marrocos mais incomodou a Espanha. O placarbranco no primeiro tempo foi uma injustiça com Marrocos.

Até sair exausto aos 20 do segundo tempo, Boufal foi um tormento para Llorente. Num lance que vai entrarqualquer lista dos melhores da Copa, o atacante marroquino recebeu na esquerda, quasecima da linha lateral, ajeitou a bola com o pé direito, passou o pé esquerdo por cima da bola e então, sem mais tocar na bola, só balançando o corpo, fez Llorente mudardireção duas vezes até perder completamente o rumo.

As mudanças que os dois técnicos promoveram ao longo do jogo só confirmaram o que se viacampo desde o apito inicial. A seu estilo, cada técnico optou por tomar mais riscos. O marroquino Walid Regragui aceitou que a bola ficasse rondando a áreaseu time quase o tempo todo. Luis Enrique apostou por ter ainda mais possebola, trocar ainda mais passes e se plantar ainda mais dentro do campo ofensivo – o que automaticamente aumentava o perigocada potencial contra-ataqueMarrocos.

A prorrogação também foitirar o fôlego, como não poderia deixarser. Com os dois times desfigurados por substituições, exaustos por causa do calor e sob a pressão crescente para evitar os pênaltis, chanceslado a lado foram criadas e desperdiças até o último minutoacréscimo do segundo tempo, quando Sarabia acertou um chute sem ângulo na traveBono. O destinoMarrocos e Espanha seria mesmo decidido nos penais. Melhor para Marrocos.